sexta-feira, 3 de junho de 2011

Psicologia e Paciente Ostomizado




Beatriz Guedes de Castro
CRP: 06/93057

Sílvia Cristina Alves Andretta
CRP 06/545397



Andretta( 2010) menciona que os tumores gástricos de importância clínica correspondem a lesões tanto benignas como malignas. A maioria se trata de carcinomas primários que derivam das glândulas da mucosa e se propaga através das vias linfáticas, o que se sucede em quase dois terços dos pacientes submetidos à exploração cirúrgica e os que já haviam feito estudos anatomopatológicos do tecido linfático.
O câncer gástrico, em índices de mortalidade são muito variáveis de país para país.
Para Lawrence e Zfass (1995) “a cirurgia é o único método curativo eficaz no
tratamento primário do câncer gástrico”. Apesar dos índices globais de sobrevivência se apresentarem muito baixos, importantes avanços tanto no tratamento cirúrgico como no pós-cirúrgico, tem conseguido ao longo dos anos, fazer com que as cirurgias gástricas aumentem a qualidade e o tempo de vida do paciente.
A raiz etiológica da palavra câncer, segundo Grzybowski, et al (2008) menciona que o termo câncer vem do grego “Karkinos” que tem seu significado como “carangueijo” ou “garras”, assim o câncer é uma doença causada pela proliferação de células que, ao invés de morrer de morte natural, desenvolve-se sem cessar.
O grego Hipócrates foi o responsável pelo nome da doença em 400 a.C, onde utilizou a palavra câncer em latim para determinar um tipo de tumor (BIZZARI, 2001).
Landskron (2008) refere que Galeno aprofundou os estudos de Hipócrates e caracterizou o carcinoma como uma doença incurável, proveniente de um tumor com crescimento descontrolado, sendo que a origem da doença e os mecanismos envolvidos no desenvolvimento dos tumores continuam desconhecidos durante milênios, mas a sentença de morte permanece presente.
Volich (2000) ressalta que Hipócrates via o homem como uma unidade organizada e entendia a doença como uma desorganização do estado de equilíbrio decorrentes dos fluidos do corpo.
Como Hipócrates, também Galeno pensava que os diferentes perfis comportamentais pudessem ser explicados pelos desequilíbrios nos fluidos do organismo: o excesso de um desses humores era considerado causa do câncer, onde desde o inicio representou uma doença sistêmica ou metabólica que deveria então ser tratada com terapias sistêmicas e não locais (BIZZARI, 2001, p30).
Tonon et al. (2007) menciona em contexto atual, onde câncer configura-se um dos principais problemas de saúde pública mundial. É uma doença crônico-degenerativa que afeta várias dimensões da vida humana e causa importante impacto econômico na sociedade, necessitando de tratamento especializado prolongado e oneroso. Além disso, é responsável pela redução do potencial de trabalho humano e perda de muitas vidas. No entanto, as evidências em torno do câncer, onde suas causas internas e externas permeiam numa existência de um fator genético importante no qual o indivíduo torna-se suscetível à doença e outros fatores (agentes cancerígenos) acabam contribuindo para o desencadeamento da doença.
Segundo o Instituto Nacional do Câncer, INCA (2010) as causas de câncer podem ser externas ou internas ao organismo, estando inter relacionadas, direcionando as causas externas a relação ao meio ambiente, hábitos ou costumes próprios de um ambiente social e cultural, e as causas internas, na maioria das vezes, são geneticamente pré determinadas, ligadas à capacidade do organismo de se defender de agressões externas.
Simonton (1987) menciona em detalhes como se apresenta o processo de desenvolvimento do câncer.
Um câncer começa com uma célula que contém informações genéticas incorretas de modo que se torna incapaz de cumprir as funções para as quais foi designada. Se esta célula produz outras células com a mesma construção genética incorreta, então um tumor começa a ser formado, composto de uma massa dessas células imperfeitas. Normalmente, as defesas do corpo e sistema imunológico reconhecem estas células e as destroem. No mínimo, o que acontece é que elas são cercadas para que não se alastrem. No caso das células malignas, mudanças celulares suficientes acontecem para que elas possam reproduzir-se rapidamente e começarem a se introduzir no tecido adjacente ( SIMONTON, 1987 p. 39).
Aureliano (2006), refere à noção de uma doença generalizada com manifestações em locais específicos perdurou por quase vinte séculos até a descrição do sistema linfático, em início do século XVII, quando atribuiu o câncer a diversos distúrbios da linfa. Neste momento, suspeitou-se que o mal também pudesse ser contagioso, levando o indivíduo a exclusão e a discriminação, sendo recusado em vários hospitais.
O autor acima postula que a partir do século XVII, surgiram às teorias da doença restrita a um determinado tecido do organismo, formulando, assim, o conceito de disseminação a distância de metástase que em grego significa “mudança de lugar”, constatando também que o sangue e a linfa eram os veículos através dos quais a doença se propagava. A sensação de importância diante da doença é produzida por esse caráter migratório (AURELIANO, 2006).
Aureliano (2006), postula que foi somente a partir da metade do século XIX que se descobriu que o câncer resulta do desenvolvimento anormal de células, deixando de ocupar o lugar de ser apenas mais um dentre as doenças que desafiam a ciência. Desde as constatações de Hipócrates sobre a doença até a verificação de sua localização em células transcorreram 2400 anos.
O câncer é considerado uma doença influenciada por diversos fatores que compromete a vida do doente a curto ou ao longo prazo onde caracteriza-se por ser uma doença que impõe mudanças significativas em torno da vida do individuo que relaciona-se com ela, assim ocasionando alterações físicas, psicológicas, emocionais e sociais no curso do processo saúde – doença, impulsionando o doente para novas formas de enfrentamento do cotidiano.
A palavra câncer é utilizada para descrever um grupo de doenças que se caracterizam pela anormalidade das células e pela sua divisão excessiva, no entanto vem a existir uma grande variedade dos tipos de câncer provavelmente com uma etiologia multifatorial, onde para que a doença se manifeste, parece ser necessária uma operação conjunta de vários fatores como: predisposição genética, exposição a fatores ambientais de risco, determinados vírus, algumas substancias alimentícias, entre outros (DE CARVALHO; MAGUI, GIMENES, 2000, p.47).
Andretta (2010) postula que nossa sociedade valoriza a boa apresentação estética corporal e coloca em alto valor no asseio e ausência de odor corporal. Muitas pessoas adquirem comportamentos de excessiva limpeza como forma de aceitação frente ao grupo social. Muitos ostomizados tendem a se isolar por sentirem-se convencidos de que não serão aceitos no grupo e acabam antecipando um medo de rejeição social.
Um estoma de acordo com a autora acima é temporário quando ele faz parte de um tratamento e existe a possibilidade de reconstrução do trânsito intestinal. Quando ele é definitivo, houve ressecção, não havendo a mesma possibilidade de reconstrução.
O uso da bolsa modifica a condição física e psíquica do paciente que agora tem que se adaptar a uma nova situação. Esta se reflete em reavaliar sua imagem corporal, social e sexual. Seu estado emocional passa por alterações significativas, podendo haver estágios de depressão, negação e mania.
A preocupação estende-se ao meio social com motivos concretos que limitam a
reincersão da pessoa em seu meio.
Suas funções sexuais sofrem alterações orgânicas devido a lesões do sistema
nervoso autônomo, o que gera fantasias e medos, além de insegurança e inibição sexual.
O paciente precisa descobrir um novo sentido para sua vida com um novo órgão e reaprender habilidades para a sua reincersão social e para sua vida sexual. É um momento onde se instaura um grande conflito psíquico; regras, conceitos e pré-conceitos precisam ser reavaliados e reinceridos na vida do paciente.

Todo este trabalho é melhor fixado se houver a participação da família ou de
pessoas significativas na vida do paciente. Entendendo as mudanças eles também podem auxiliá-lo nesta nova etapa.
Observa-se, diante do exposto acima, que o papel da psicoterapia para esse paciente é de suma importância no que tange a suas reavaliações quando se encontra exposto a situações inesperadas e adversas, desde a confirmação dos procedimentos cirúrgicos e póscirúrgicos(uso da bolsa de ostomia), até a elaboração e aceitação de sua vida com um novo órgão.
Desta-se, porém, que todo este processo torna-se penoso e bastante difícil, pois
esbarram em questões que refletem diferentes tipos e históricos de aprendizagem necessitando que haja um atendimento individualizado e particularizado a cada paciente,anteriormente a uma inserção no grupo ou meio social.
Sendo assim, penso que a psicologia pode contribuir com seus conhecimentos na elaboração e resignificação da vida; possibilitando uma melhor recuperação no pósoperatório,partindo do princípio de que a bolsa não é sinônimo de morte e sim de vida.

quinta-feira, 2 de junho de 2011

A Interface entre Psicologia Hospitalar e Psico-oncologia




Capítulo de Minha Monografia de especialização em Psicologia e Saúde: Psicologia Hospitalar pela PUC SP

ATUAÇÃO DO PSICÓLOGO HOSPITALAR JUNTO ÀS MULHERES DIAGNOSTICADAS COM CÂNCER DE MAMA
BEATRIZ GUEDES DE CASTRO



A Interface entre Psicologia Hospitalar e Psico-oncologia

Tirei algumas considerações....


Tedesco (2007) ressalta que com o passar do tempo, a Psicologia foi se transformando, a Psicologia da Saúde foi se subdividindo em várias ramificações, e entre elas, a Psicologia Hospitalar.
O psicólogo na instituição hospitalar busca propiciar aos pacientes hospitalizados a minimização do sofrimento emocional que o processo da doença e a hospitalização desencadeia no paciente.
De acordo com Leitão (1993) a Psicologia Hospitalar ganhou destaque no momento em que psicológicos com caráter terapêutico, no qual vinha a falar em casas de repousos e clínicas Psiquiátricas,onde se localizava psicólogos aplicando técnicas para fins diagnósticos e prognósticos junto a psicopatologia e à psiquiatria.
Conforme Campos (1995) o paciente quando busca um atendimento hospitalar, não leva só seu corpo para ser tratado, mas sim por inteiro e por extensão acaba levando a família que participa de seu adoecer, suas internações e seus restabelecimentos.
Carvalho (2008) afirma que a ansiedade pode estar presente em todas as etapas da evolução da doença (prevenção, diagnóstico, tratamento, exames de controle, recidiva, espera de tratamentos novos e terminalidade)
De acordo com Gimenes (2003) a partir de estudos de Freud, sobre histeria de conversão (limitação física que ocorre devido a conflitos psicológicos sem nenhuma causa orgânica) que a classe médica e científica começam a reconhecer a interação entre os processos emocionais e o processo corporal que o enfermo apresenta.
Gimenes (2003, p.38) postula que quando se trata de doenças crônicas, muitas vezes degenerativas torna-se importante uma organização de conhecimentos que possibilitem uma intervenção psicológica, para qual outros profissionais possam estar colaborando para definição de profilaxias no intuito de interessados sejam eles, pacientes, familiares, profissionais, possam assim a lidar de forma adequada com o diagnóstico, tratamento e suas conseqüências.
Barão (2009) afirma que os aspectos em torno do adoecer acredita que um atendimento psicológico deva estar sempre presente dentro de um hospital.
Lôbo et al. (2006) afirma que pensar numa cirurgia mutiladora é lembrar de toda agressão à imagem e ao esquema corporal nos aspectos simbólicos que a cirurgia possa despertar, remetendo assim, ao que se pode chamar de ferida narcísica.
Macieira & Maluf (2008) ressaltam que a mulher após a mastectomia, a reconstrução mamária pode ou não ser realizada, quando for realizada, há uma diminuição dos efeitos negativos no qual diz respeito ao bem estar psicossocial da mulher, e as mulheres submetidas à mastectomia sem reconstrução mamária, costumam ser acometidas por maior morbidade psicossocial, causadas pelos fatores relacionados a ansiedade, depressão, auto estima, sexualidade e auto imagem.
Segundo Bergamasco & Angelo (2001) descrevem que o atendimento psicológico mais utilizado como forma de tratamento é aquele iniciado após o diagnóstico e definição da conduta terapêutica oncológica.
Ramos & Lustosa (2009) defendem uma realização de uma avaliação psicológica individual, com adequado planejamento dos atendimentos subseqüentes que poderão ser em grupo ou individual dependendo do estado emocional e necessidade da paciente.
As autoras descrevem que existe uma comprovação na eficácia diante da utilização da metodologia de grupos para o paciente com câncer, no sentido de melhorar o ajustamento psicossocial frente à doença.
De acordo com Liberato & Carvalho (2008) o câncer apresenta-se como um desafio atual para os pacientes acometidos da doença em todo seu contexto psicossocial e também para os profissionais da saúde, pois o câncer requer tratamentos dolorosos, invasivos, muitas vezes mutiladores que comprometem a qualidade de vida do paciente
Simonetti (2004) ressalta que a psicologia hospitalar aponta para uma estratégia em torno do “aqui e agora”, exigindo do psicólogo hospitalar muita flexibilidade.
Conforme Felício (2003) pode-se considerar a temática englobando uma aliança com a saúde “a psicologia hospitalar é justamente o campo de ação na saúde para onde converge a sistematização da compreensão do paciente como um ser humano”.
Neder (2003) com seu pioneirismo de trabalho na área hospitalar, afirma desde 1957 que o “psicólogo, como profissional da saúde, contribui para o bem estar humano, cuidando da qualidade de vida, condicionadora da saúde”.

COPING....



Adriane Scomazzon Antoniazzi
Débora Dalbosco Dell'Aglio
Denise Ruschel Bandeira
Universidade Federal do Rio Grande do Sul



Resumo


O conceito de coping tem sido descrito como o conjunto das estratégias utilizadas pelas pessoas para adaptarem-se a circunstâncias adversas ou estressantes. O presente artigo apresenta os modelos de coping de Folkman e Lazarus, e de Rudolph, Denning e Weisz, bem como suas diferentes posições teóricas e metodológicas. As definições de estilos e estratégias de coping, sua eficácia e possíveis relações com traços de personalidade são discutidas. É salientada a necessidade de uma teoria de stress-coping específica para crianças, tendo em vista as mudanças cognitivas que ocorrem no curso de seu desenvolvimento. Este artigo apresenta também questões controversas sobre o tema e aponta a necessidade de pesquisas sobre coping no Brasil, para auxiliar na compreensão e desenvolvimento deste conceito.
Palavras-chave: Coping, Stress, Estratégias de coping, Estilos de coping



O coping é concebido como o conjunto das estratégias utilizadas pelas pessoas para adaptarem-se a circunstâncias adversas. Os esforços despendidos pelos indivíduos para lidar com situações estressantes, crônicas ou agudas, têm se constituído em objeto de estudo da psicologia social, clínica e da personalidade, encontrando-se fortemente atrelado ao estudo das diferenças individuais. Historicamente, três gerações de pesquisadores têm-se dedicado ao estudo do coping. Diferenças marcantes podem ser observadas em suas construções, tanto a nível teórico quanto a nível metodológico, decorrentes de suas filiações epistemológicas (Suls, David & Harvey, 1996).

Desde o início do século, pesquisadores vinculados à psicologia do ego têm concebido o coping, enquanto correlato aos mecanismos de defesa, motivado interna e inconscientemente como forma de lidar com conflitos sexuais e agressivos (Vaillant, 1994). Eventos externos e ambientais, posteriormente incluídos como possíveis desencadeadores dos processos de coping foram, a exemplo dos mecanismos de defesa, categorizados hierarquicamente no sentido dos mais imaturos aos mais sofisticados e adaptativos (Tapp, 1985). Assim, para esta primeira geração de pesquisadores, o estilo de coping utilizado pelos indivíduos era concebido como estável, numa hierarquia de saúde versus psicopatologia.

A partir desta perspectiva inicial, algumas distinções foram sendo feitas no sentido de diferenciar os mecanismos de defesa do coping propriamente dito. A principal modificação feita neste sentido consistiu na distinção entre os comportamentos associados aos mecanismos de defesa, classificados como rígidos, inadequados com relação à realidade externa, originários de questões do passado e derivados de elementos inconscientes. Já os comportamentos associados ao coping foram classificados como mais flexíveis e propositais, adequados à realidade e orientados para o futuro, com derivações conscientes. Esta abordagem tem sido bastante criticada em função das dificuldades teóricas da psicologia do ego de testar empiricamente suas concepções (Folkman & Lazarus, 1980).

A partir da década de 60, estendendo-se pelas duas décadas seguintes, uma segunda geração de pesquisadores apontou para uma nova perspectiva com relação ao coping. Esta nova tendência buscou enfatizar os comportamentos de coping e seus determinantes cognitivos e situacionais (Suls, David & Harvey, 1996). Pesquisadores passaram a conceitualizar coping como um processo transacional entre a pessoa e o ambiente, com ênfase no processo, tanto quanto em traços de personalidade (Folkman & Lazarus, 1985). Esta época foi marcada por importantes avanços na área, que geraram inúmeras publicações, em especial pelo grupo de Lazarus e Folkman (Folkman & Lazarus, 1980, 1985; Lazarus & Folkman, 1984 ).

Mais recentemente, uma terceira geração de pesquisadores têm-se voltado para o estudo das convergências entre coping e personalidade. Esta tendência têm sido motivada, em parte, pelo corpo cumulativo de evidências que indicam que fatores situacionais não são capazes de explicar toda a variação nas estratégias de coping utilizadas pelos indivíduos. Por outro lado, o interesse despertado pela credibilidade científica dos estudos sobre traços de personalidade, em especial, o modelo dos Cinco Grandes Fatores tem ampliado os estudos nesta direção (Holahan & Moos, 1985; McCrae & Costa, 1986; O'Brien & DeLongis, 1996; Watson & Hubbard, 1996). Os traços de personalidade mais amplamente estudados, que se relacionam às estratégias de coping, são otimismo, rigidez, auto-estima e locus de controle (Carver & Scheier, 1994; Carver, Scheier & Weintraub, 1989; Compas, Banez, Malcarne & Worsham, 1991; Lopez & Little, 1996; Parkes, 1984).

Muitos dos artigos publicados sobre coping referem-se à construção de instrumentos de medida. Embora muitos anos de desenvolvimento teórico e pesquisa tenham se passado, e uma grande variedade de inventários e checklists tenham sido desenvolvidos (por exemplo, Amirkhan, 1990; Carver, Scheier & Weintraub, 1989; Endler & Parcker, 1990; Folkman & Lazarus, 1980), não chegamos, ainda, a um entendimento compreensivo da estrutura do coping.

Modelos de Coping

Numa perspectiva cognitivista, Folkman e Lazarus (1980) propõem um modelo que divide o coping em duas categorias funcionais: coping focalizado no problema e coping focalizado na emoção. Esta construção baseou-se em análises fatoriais que geraram dois fatores principais utilizados pelos pesquisadores para definir os dois tipos de estratégias de coping. Nesta perspectiva, coping é definido como um conjunto de esforços, cognitivos e comportamentais, utilizado pelos indivíduos com o objetivo de lidar com demandas específicas, internas ou externas, que surgem em situações de stress e são avaliadas como sobrecarregando ou excedendo seus recursos pessoais (Lazarus & Folkman, 1984). Esta definição implica que as estratégias de coping são ações deliberadas que podem ser aprendidas, usadas e descartadas. Portanto, mecanismos de defesa inconscientes e não intencionais, como negação, deslocamento e regressão, não podem ser considerados como estratégias de coping. Além disso, somatização, dominação e competência são vistos como resultados dos esforços de coping e não como estratégias (Ryan-Wenger, 1992).

O modelo de Folkman e Lazarus (1980) envolve quatro conceitos principais: (a) coping é um processo ou uma interação que se dá entre o indivíduo e o ambiente; (b) sua função é de administração da situação estressora, ao invés de controle ou domínio da mesma; (c) os processos de coping pressupõem a noção de avaliação, ou seja, como o fenômeno é percebido, interpretado e cognitivamente representado na mente do indivíduo; (d) o processo de coping constitui-se em uma mobilização de esforço, através da qual os indivíduos irão empreender esforços cognitivos e comportamentais para administrar (reduzir, minimizar ou tolerar) as demandas internas ou externas que surgem da sua interação com o ambiente. Este modelo tem sido referido como o mais compreensivo dos modelos existentes (Beresford, 1994).

Rudolph, Denning e Weisz (1995) apontaram contradições nas definições de coping realizadas por diferentes autores. Por definição, coping é visto como um mediador entre um estressor e o resultado advindo desse estressor (Folkman & Lazarus, 1980; Peterson, 1989). Contudo, há uma relação intrínseca entre as estratégias de coping e seus resultados. Este fato tem provocado confusão acerca do que seriam tentativas de coping e resultados de coping (Peterson, 1989), ou recursos de coping e resultados de coping (Beresford, 1994).

Estas dificuldades levaram Rudolph e colaboradores (1995) a propor que o coping deveria ser entendido como um episódio, no qual há uma tentativa de separação entre três aspectos fundamentais: uma resposta de coping, um objetivo subjacente a essa resposta e um resultado. Tal resposta deve ser diferenciada de uma resposta de stress, que é não intencional e sem objetivo.

Nesta perspectiva, considera-se que a resposta de coping é uma ação intencional, física ou mental, iniciada em resposta a um estressor percebido, dirigida para circunstâncias externas ou estados internos (Lazarus & Folkman, 1984). A resposta de stress é qualquer resposta envolvendo uma reação emocional ou comportamental espontânea. O objetivo de coping constitui-se, desta forma, na intenção de uma resposta de coping, geralmente orientada para a redução do stress. Ao propor este esquema, os autores salientam a diferença entre resultados de coping, que são as conseqüências específicas da resposta de coping e os resultados de stress, ou seja, as conseqüências imediatas da resposta de stress. Ambos podem promover, ou não, a adaptação do indivíduo.

Para Rudolph e colaboradores (1995), o episódio de coping faz parte de um processo que sofre influência de múltiplas variáveis. Dois conceitos encontram-se envolvidos nesse processo, os moderadores e os mediadores. Estas variáveis costumam ser utilizadas indistintamente na pesquisa em psicologia social, mas foram diferenciadas por Baron e Kenny (1986) e traduzidas para o coping por Rudolph e colaboradores (1995). Os moderadores são caracterizados como variáveis que afetam a direção ou a intensidade da relação entre uma variável independente e uma variável dependente. Em termos de coping, essa variável seria aquela pré-existente que influenciaria o resultado de coping, mas que não seria influenciada pela natureza do estressor ou pela resposta de coping. Mais especificamente, os moderadores refletiriam as características da pessoa (nível de desenvolvimento, gênero, experiência prévia, temperamento), do estressor (tipo, nível de controlabilidade), do contexto (influência paterna, suporte social) bem como a interação entre esses fatores.

Os mediadores, por sua vez, são definidos como mecanismos através dos quais a variável independente é capaz de influenciar a variável dependente. Especificamente no coping, estes mecanismos seriam, por exemplo, a avaliação cognitiva e o desenvolvimento da atenção. Sua característica principal é que eles seriam acionados durante o episódio de coping, em oposição aos moderadores, que seriam pré-existentes (Rudolph, Denning & Weisz ,1995).

A falta de unanimidade com relação a estes conceitos tem levado os pesquisadores na área a adotarem diferentes nomenclaturas para descrever construtos similares. Desta forma, o que Rudolph e colaboradores (1995) têm descrito como moderadores pode ser relacionado ao conceito de recursos pessoais e sócio-ecológicos de coping, descritos por Beresford (1994). Os recursos pessoais de coping são, segundo este autor, constituídos por variáveis físicas e psicológicas que incluem saúde física, moral, crenças ideológicas, experiências prévias de coping, inteligência e outras características pessoais. Os recursos sócio-ecológicos, encontrados no ambiente do indivíduo ou em seu contexto social, incluem relacionamento conjugal, características familiares, redes sociais, recursos funcionais ou práticos e circunstâncias econômicas.

Segundo sua proposição, a disponibilidade de recursos afeta a avaliação do evento ou situação e determina que estratégias de coping o indivíduo pode usar. Geralmente, as pesquisas têm focalizado os fatores sócio-ecológicos, pois eles são mais facilmente mensuráveis do que os recursos pessoais (Billings & Moss, 1984; Mellins, Gatz, & Baker, 1996; Weisz, McCabe, & Denning, 1994).

Os recursos sócio-ecológicos podem, entretanto, atuar como fatores de risco e de resistência ao ajustamento do indivíduo. Neste sentido, os recursos de coping estão, segundo Beresford (1994), fortemente vinculados à noção de vulnerabilidade, já que a vulnerabilidade aos efeitos do stress é mediada por recursos de coping. Dependendo da qualidade e da disponibilidade destes recursos, o sujeito torna-se mais vulnerável ou mais resistente aos efeitos adversos do stress. Stress e vulnerabilidade podem ser um círculo vicioso, em que o stress afeta os recursos de coping e incrementa a vulnerabilidade.

Estilos e Estratégias de Coping

Tratando-se de coping, é importante distinguir entre o que os pesquisadores têm denominado estratégias de coping e estilos de coping. Embora esta distinção não seja completamente consensual, sua descrição faz-se necessária para uma mais ampla compreensão deste conceito.

Em geral, os estilos de coping têm sido mais relacionados a características de personalidade ou a resultados de coping, enquanto as estratégias se referem a ações cognitivas ou de comportamento tomadas no curso de um episódio particular de stress. Embora os estilos possam influenciar a extensão das estratégias de coping selecionadas, eles são fenômenos distintos e têm diferentes origens teóricas (Ryan-Wenger, 1992).

Eficácia das estratégias de coping

Outro aspecto controverso na literatura do coping diz respeito à eficácia das estratégias empregadas pelos indivíduos durante os episódios de coping. De acordo com Beresford (1994), embora o julgamento sobre a eficácia ou adaptabilidade das estratégias de coping tenha se mostrado extremamente subjetivo em muitas pesquisas, coping deve ser visto como independente do seu resultado. No modelo de coping e stress proposto por Lazarus e Folkman (1984), qualquer tentativa de administrar o estressor é considerado coping, tenha ela ou não sucesso no resultado. Desta forma, uma estratégia de coping não pode ser considerada como intrinsecamente boa ou má, adaptativa ou mal adaptativa. Torna-se então necessário considerar a natureza do estressor, a disponibilidade de recursos de coping e o resultado do esforço de coping.

Para Compas (1987), ambas as estratégias de coping, focalizada no problema e focalizada na emoção são importantes, mas a sua eficácia é caracterizada por flexibilidade e mudança. Novas demandas requerem novas formas de coping, pois uma estratégia não é eficaz para todos os tipos de stress. O resultado de uma estratégia de coping é difícil de avaliar porque pode mudar com o tempo. Além disso, uma estratégia de coping que alivia imediatamente o stress pode ser a causa de dificuldades posteriores. Beresford (1994) salienta que o processo de coping não pode ser simplificado pois, quando um indivíduo lida com um estressor, as estratégias de coping são utilizadas individualmente, consecutivamente e em combinação. Assim, o impacto de uma estratégia de coping pode ser confundida pelo efeito de outras estratégias.

Coping e desenvolvimento

Lazarus e DeLongis (1983) indicam claramente que os processos de coping variam com o desenvolvimento da pessoa. Essa variabilidade ocorre devido a grandes modificações que se processam nas condições de vida, através das experiências vivenciadas pelos indivíduos. Segundo este ponto de vista, não somente o envelhecimento é levado em consideração, mas também o significado dos eventos estressantes nos diversos momentos da vida dos indivíduos. Devido a essa variabilidade, os autores defendem a idéia de que o coping seja estudado longitudinalmente.

A maioria dos trabalhos sobre processos de coping na criança tem usado a teoria de stress de Lazarus e Folkman (1984), que descreve um processo recíproco de avaliação cognitiva de recursos de coping e de estressores. No entanto, Compas (1987) aponta a necessidade de alterações para aplicar as noções de stress e coping às ações de crianças e adolescentes. Para entender os recursos, estilos e esforços de coping na infância é necessário compreender melhor seu contexto social, tendo em vista a dependência da criança em relação ao adulto para sua sobrevivência. Além disso, os esforços de coping da criança são delimitados por sua preparação biológica e psicológica para responder ao stress. Por outro lado, as características básicas do desenvolvimento cognitivo e social tendem a afetar o que as crianças experimentam como stress e como elas lidam com situações estressantes. Estão incluídas nessas características as crenças sobre a auto-percepção e auto-eficácia, mecanismos inibitórios e de auto-controle, atribuição de causalidade, relacionamento com pais e amigos, entre outras.

Por outro lado, Ryan-Wenger (1992) salienta a necessidade de uma teoria de stress-coping específica para a criança, considerando que os estressores da criança não são os mesmos do adulto. Os estressores da criança se referem a situações com os pais, com outros membros da família, professores ou condições sócio-econômicas que estão fora de seu controle direto. Muitos estressores são mais difíceis de serem modificados pela própria criança do que pelos adultos. O nível de desenvolvimento cognitivo também influencia a utilização de determinadas estratégias, pois a avaliação de um estressor envolve vários processos simultâneos: a criança precisa relacionar o evento estressante com a lembrança de eventos semelhantes enfrentados em outros momentos, necessita definir os parâmetros do evento estressante, tais como a intensidade potencial e a duração e, ainda, avaliar a probabilidade de ocorrência do evento além de sua durabilidade (Peterson, 1989).

Estudos de coping em crianças têm investigado eventos de vida considerados estressantes, tais como situações envolvendo o divórcio dos pais, situações de hospitalização da criança, consultas médicas e odontológicas e situações relacionadas a resultados escolares. (Ayers, Sandler, West, & Roosa, 1996; Carson & Bittner, 1994; Compas, Malcarne, & Fondacaro, 1988; Kliewer, & Sandler, 1993; Weisz et al, 1994). Nestas pesquisas têm sido descritas potenciais diferenças relacionadas à gênero e idade no uso das estratégias de coping. Tem sido verificado que o gênero pode influenciar a escolha das estratégias de coping porque meninos e meninas são socializados de forma diferente. As meninas podem ser socializadas para o uso de estratégias pró-sociais enquanto que os meninos podem ser socializados para serem independentes e utilizar estratégias de coping competitivas (Lopez & Little, 1996).

Quanto à idade, Heckhausen e Schulz (1995) sugerem que as habilidades necessárias para usar coping focalizado no problema ou focalizado na emoção emergem em diferentes pontos do desenvolvimento. Para Compas e colaboradores (1991), as habilidades para coping focalizado no problema parecem ser adquiridas mais cedo, nos anos pré-escolares, desenvolvendo-se até aproximadamente 8 a 10 anos de idade. As habilidades de coping focalizado na emoção tendem a aparecer mais tarde na infância e se desenvolvem durante a adolescência, já que as crianças muito pequenas ainda não têm consciência de seus próprios estados emocionais. Além disto, aprender as habilidades relacionadas ao coping focalizado na emoção através de processos de modelagem é mais difícil do que aprender as habilidades de coping focalizadas no problema, mais facilmente observadas pelas crianças no comportamento dos adultos. Os adolescentes utilizam mais coping focalizado na emoção do que as crianças, mas não diferem de jovens adultos, sugerindo que estas mudanças no desenvolvimento de coping ocorrem até o final da adolescência (Compas et al, 1991).

Diversas pesquisas têm buscado relacionar os processos de coping com adaptação ao stress durante a infância e adolescência. Estes trabalhos têm investigado, mais especificamente, o coping relacionado a apego e separação durante a infância, suporte social, resolução de problemas interpessoais e cognição, coping em contextos aquisitivos, resiliência e invulnerabilidade ao stress, regulação da emoção, temperamento entre outros (Carson & Bittner,1994; Dweck, Goetz, & Strauss, 1980, Hock & Clinger, 1981; Lopez & Little, 1996; Rossman, 1992).

terça-feira, 31 de maio de 2011

A Influência da Família na Aquisição de Modelos Agressivos pelas Crianças



Eraldo C. Batista, Benedito A. Oliveira e Simone L. Pires

Muito legal esse artigo... estou compartilhando!!!!

Resumo: O objetivo deste estudo é investigar as relações entre a dinâmica familiar e o comportamento anti-social de 12 crianças de uma escola da rede pública municipal de uma cidade do interior do Estado de Rondônia. Utilizando-se de instrumentos que avaliam as práticas educativas usadas pelos pais para com os filhos e a percepção da criança frente ao suporte familiar recebido, o trabalho busca analisar a influência da família no comportamento da criança. Os resultados gerais encontrados apontam para uma correlação entre o comportamento agressivo destas crianças e o ambiente familiar ao qual fazem parte. Assim, o estudo conclui que estas famílias por meio de sua constelação e de suas práticas educativas configuram-se como espaço gerador de modelos agressivos. As considerações finais sinalizam a necessidade de futuros estudos para expandir a compreensão do comportamento agressivo e sua relação com a violência familiar.

Palavras-Chave: Comportamento agressivo; violência familiar; criança; estilos parentais; práticas educativas.

The Influence Of The Family In The Acquisition Of Aggressive Models By The Children.

Abstract: This study aimed to investigate the relationship between the family dynamics and anti-social behavior of twelve children at a municipal public school network in a provincial city of Rondônia. Using instruments that evaluate the educational practices used by parents with their children and the child`s perception facing the family support, the study sought to analyze the influence of the family on the behavior of the child. The results point towards a general correlation between the aggressive behavior of these children and their family environment which the children belongs. Thus, the study concludes that these families through their behavior and their educational practices are configured as a generator of an aggressive environment models. Final considerations point to the need for further research to expand understanding of aggressive behavior and its relationship with family violence. Keywords: Aggressive behavior, family violence; child, parenting styles, educational practices.

Introdução

Nas definições antropológicas, o foco de interesse do estudo acerca das famílias consiste na estrutura das suas relações Berenstein (1988), ou seja, no grau e na natureza do parentesco. De acordo com o autor, a estrutura elementar de parentesco inclui três tipos de vínculos: o consanguíneo (entre irmãos), de aliança (marido e esposa) e de filiação (pais e filhos). Para Antoni & Koller (2000), o grupo familiar tem sua definição psicológica como um conjunto de relações. Desta forma, a família pode ser vista como totalidade, sistema ou grupo formado por pessoas que se relacionam entre si, por parentesco e/ou por se considerarem pertencentes àquele contexto.

Assim, o objetivo deste estudo é abordar os principais aspectos referentes ao comportamento da família frente às condutas agressivas da criança, enfatizando a importância da interação parental e as práticas educativas utilizadas como modelos pelos pais sobre o desenvolvimento comportamental da criança, privilegiando uma perspectiva essencialmente psicológica. Num primeiro momento, discutem-se as consequências negativas da violência vivida na família sobre o desenvolvimento biopsicossocial da criança. Em seguida, apresentam-se alguns estudos que fundamenta a influência da família na aquisição de modelos agressivos pelas crianças, tal como Bandura (2008) que define que o comportamento agressivo da criança é resultado da agressão modelada e reforçada pela família. Partindo dessa premissa, entende-se que a pesquisa sobre agressividade no contexto familiar é importante, pois dá maior visibilidade sobre a questão e fornece melhores informações.

Considerando que a agressão vivenciada no âmbito familiar pode interferir no comportamento da criança, Lisboa & Koller, (2001) assina que a escola é um exemplo de microssistema ecológico no qual a agressividade prejudica o desempenho acadêmico e o estabelecimento de relações saudáveis e próximas. Assim, entende-se que uma das possíveis soluções para a redução da agressividade da criança no espaço escolar consiste em entender o seu próprio universo.

1. A Violência No Ambiente Familiar

Por ser o primeiro sistema no qual o individuo interage, a família consiste num micro-sistema onde cada membro tem uma posição e um papel socialmente definido, que reflete sua organização estrutural e funcional Gomes et al 2007. O que nos remete que a família é responsável pela sobrevivência física e psíquica da criança. Porém, nem sempre essa imagem de proteção cumpre sua função. O interior da família, lugar mitificado em sua função de cuidado e proteção, pode ser palco de muitas violências.

O fenômeno da violência familiar é, infelizmente, universal, favorecendo condições de riscos psicossociais para a família. Como afirma Milani & Loureiro (2008), a violência no contexto familiar constitui um fenômeno complexo, que envolve questões como a desigualdade social e prejuízos na qualidade de vida que atingem as famílias com comprometimento nas relações intrafamiliares e é evidenciado pelo abuso de poder.

Existem várias definições de violência familiar. Para Koller (1999), todo ato de violência tem em comum o fato de ser caracterizado por “ações e, ou omissões que podem cessar, impedir, deter ou retardar o desenvolvimento pleno dos seres humanos”. De acordo com a autora existem três papéis no ato da violência, que podem ser confundidos, mesclados ou não: o papel de vítima, o de autor e o de testemunha. Considerando que todo ato de violência é sempre evidenciado pelo abuso de poder, Eisenstein & Souza (1993), afirmam que a violência pode ser observada como toda ação danosa à vida e à saúde do indivíduo, caracterizada por maus-tratos, cerceamento da liberdade ou imposição da força. Ou seja, a criança, por sua maior vulnerabilidade e dependência, se torna vítima freqüente de atos abusivos.

Corroborando esta afirmação Bock, Furtado & Teixeira (2002) postulam que a família, é, em muitos casos, um mito, pois muitas crianças sofrem ali suas primeiras experiências de violência: a tortura psicológica, a agressão física, o abuso sexual entre outras menos visíveis, porém tão danosa quanto. A violência da qual a criança pode ser vítima, ocorre de duas maneiras, como define Brancalhone (2003): a criança como parte integrante da família, pode estar exposta à agressão direta - quando ela é o alvo da agressão - ou indireta - quando presencia cenas de violência entre os pais.

A violência familiar é um problema social grave que atinge toda a população e precisa ser estudada sob múltiplos enfoques. Para alguns pesquisadores é possível inferir que as várias modalidades de violência ocorridas no ambiente familiar podem ser responsáveis por grande parte dos atos violentos. Ou seja, a violência familiar tem sido associada com agressividade infantil e delinqüência. Bandura (2008) assina que no caso de respostas agressivas as crianças imitam o tipo de relacionamento mantido com o modelo adulto e que a mera observação de modelos agressivos parece ser condição suficiente para produzir respostas imitativas de agressão. Ou seja, a observação de atos agressivos na família pode ser imitada pela criança no seu cotidiano.

O comportamento agressivo é definido como toda ação que causa ou implica danos ou prejuízos a alguém e é expresso de forma confrontativa e/ou não-confrontativa. (Lisboa & Koller, 2001). Crianças agressivas expressam suas dificuldades de interação e adaptação através de seus comportamentos.

De acordo com o Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM-IV-TR), o comportamento agressivo encontra-se, inserido no quadro de transtornos de conduta, que é caracterizado por um padrão persistente de comportamento que viola os direitos básicos dos outros e as normas ou regras sociais importantes e apropriadas à idade (American Psychiatric Association, 2003). Estudo realizado por Corrêa e Williams (2000), sobre o impacto da violência conjugal na saúde mental das crianças, concluiu que havia altos índices de depressão, agressividade, isolamento e baixa autoestima em crianças que presenciaram atos violentos entre os pais.

1.1. A Agressividade Aprendida Através Da Modelação

Assim como a violência, os conceitos de agressão e agressividade envolvem múltiplos enfoques e direcionamentos. Stith (1993) citado por Meneghel, Giugliani & Falceto (1998), assina que, a agressividade entre crianças e adolescentes parece estar aumentando, porém este comportamento pode ser resultado de uma conduta menos repressiva em relação a este fenômeno. Por outro lado, as crianças podem estar mais agressivas como resposta à violência estrutural da sociedade.

A teoria social da aprendizagem (Bandura, 1973) é de grande importância para a compreensão da agressividade humana na medida em que focaliza o papel do ambiente social na aquisição, manutenção e modificação das respostas agressivas. De acordo com Bandura, Azzi, Polydoro & cols, (2008), as principais fontes de estilos de comportamento agressivo na sociedade moderna são a agressão modelada e reforçada pela família, onde o sujeito: 1. Aprende um estilo de conduta agressivo; 2. Alteram suas restrições sobre comportamento agressivo; 3. Torna-se insensível e habituado com a violência. Ou seja, a agressividade aprendida através da modelação. Bandura (2008) postula que quando adquirimos novos comportamentos em decorrência da imitação de pautas de conduta a partir de modelos, falamos em modelação. Assim, entende por modelação: o processo de aquisição de comportamentos a partir de modelos seja este programado ou incidental. Também se nomeia como modelação a técnica de modificação de comportamento com o uso de modelos. (Bandura, 1965a, 1972, 2008).

Quando os pais ferem-se mutuamente, a ansiedade dos filhos é esmagadora, eles podem desenvolver um padrão crescentemente agressivo em suas relações familiares, escolares e sociais (Wolff, 1985 apud Meneghel, Giugliani & Falceto1998).

Para (Bandura & Huston 1961, Bandura, Azzi, Polydoro & cols, 2008), a maior parte do repertório de socialização do indivíduo é adquirida por meio da “identificação com adultos significativos na vida da criança”. Ainda de acordo com o autor, pesquisas evidenciaram que a exposição a modelos agressivos pode: a) aumentar a probabilidade de imitação de comportamento agressivo; b) aumentar a imitação de respostas verbais não agressivas, emitidas pelo modelo agressivo; c) levar à imitação do comportamento agressivo, mesmo na ausência de desempenho durante a observação, sem reforçamento adicional do observador, e mesmo quando o modelo não fora reforçado ao exibir as respostas agressivas.

Instrumento

Para a coleta dos dados foi utilizada a Escala de Percepção por Professores dos Comportamentos Agressivos de Crianças na Escola (Lisboa & Koller, 2001). A escala é constituída de 41 itens que avaliam o comportamento da criança, medindo sua agressividade na escola. Cada item representa uma afirmação, sendo que a resposta deve ser dada pelo professor em uma escala do tipo Likert de 5 pontos - onde 1 corresponde a discordo totalmente, e 5 corresponde à resposta concordo totalmente.

Utilizou-se também uma entrevista semi-estruturada com as famílias para levantamento de dados contendo itens de caracterização (perfil sócio-demográfico: sexo, classe social, idade, bairro), relacionamento e dinâmica familiar.

Após a entrevista foi aplicado o Inventário de Estilos Parentais (IEP). O objetivo deste instrumento é estudar a maneira utilizada pelos pais na educação de seus filhos. O Inventário de Estilos Parentais (IEP) é composto por 42 questões que correspondem ás setes práticas educativas, cinco delas vinculada ao desenvolvimento do comportamento anti-social: negligência, abuso físico, disciplina relaxada, punição inconsistente e monitoria negativa, e duas que promovem comportamentos pró - sociais: monitoramento positivo e comportamento moral. Cada questão consta de uma frase à qual o respondente deve indicar a frequência com que a figura materna/paterna age.

E para finalizar aplicou-se o Inventário de Percepção de Suporte Familiar – IPSF. O instrumento é constituído de 42 questões distribuídas em três fatores sendo eles:

■Afetivo-Consistente: esse fator contém vinte e um itens e evidencia as relações afetivas positivas intrafamiliares, desde o interesse pelo outro, até a expressão verbal e não-verbal de carinho, clareza nos papéis e regras dos integrantes da família, bem como habilidade nas estratégias de enfrentamento de situações-problema;
■Adaptação Familiar: esse fator é composto de treze itens que expressam sentimentos negativos em relação à família, como isolamento, exclusão, raiva, vergonha, relações agressivas de brigas e gritos, irritação, incompreensão, e ainda percepção de relações de competição na família, interesse e culpabilidade entre os membros em situações de conflitos;
■Autonomia Familiar: Composto por oito itens demonstra a percepção de autonomia que a criança tem de sua família, o que denota relações de confiança, privacidade e liberdade entre os membros da família. O Inventário de Percepção de Suporte Familiar – IPSF tem como objetivo avaliar as características da família, bem como os tipos de suporte existentes.
A Família

Com relação às famílias participantes da pesquisa percebe-se que a relação intrafamiliar é complexa, pois a falta de comunicação, somada à dificuldade para resolver problemas em conjunto são fatores negativos na criação dos seus filhos. Um dos desafios encontrado neste estudo foi a resistência da família em abordar assuntos que diz respeito à convivência entre seus membros e as práticas educativas utilizadas pelos pais para com seus filhos, uma vez que algumas dessas famílias já foram convocadas ao conselho tutelar para darem explicações sobre denúncias de negligências e maus tratos com os filhos. Em algumas dessas famílias foram detectado problemas com alcoolismos, vícios em jogatina e problemas com a justiça. Fatores que também contribuem para a mudança de comportamento intrafamiliares.

Estudos confirmam que crescer em uma família que possui um alcoólatra é sempre um desafio, principalmente quando falamos do contato direto de crianças com esta realidade. Portanto, pode-se inferir que para estas existe maior chance para o desenvolvimento de transtorno de conduta e dificuldades de entrosamento com outros colegas e pessoas da sociedade.

Considerações FinaisOs resultados apresentados confirmaram os resultados do estudo comparativo de Maldonado & Williams (2005) sobre os efeitos da violência familiar sobre o comportamento das crianças. Neste os autores concluíram que houve maior incidência de severidade de exposição à violência familiar nas crianças do sexo masculino que apresentaram comportamento agressivo na escola, quando comparadas às crianças do mesmo sexo que não apresentam tal comportamento.

Também evidencia o que a literatura especializada postula, de que as principais fontes de estilos de comportamento agressivo na criança são a agressão modelada e reforçada pela família (Bandura, 2008). Ou seja, o comportamento agressivo apresentado pela criança no contexto escolar pode ser considerado reflexos, reprodução ou até mesmo devolução da violência sofrida no ambiente familiar da qual a criança é a primeira vítima. Onde a maioria está exposta a fatores de risco e parece não apresentar rede protetora suficiente para minimizar esses efeitos.

Nesse sentido faz se necessário, portanto, a reestruturação da família fundamentada em relações mais simétricas entre pais e filhos, que possibilite mudança nos comportamentos não só da criança mais em toda a família. “A tolerância às diferenças, as trocas permitidas, respeitando os limites, e os papéis de cada membro do grupo, representa o forte vínculo que torna a família o sustentáculo emocional do ser humano” (Day at. al 2003). Todos os esforços que permitam o reforço deste espaço de entendimento irão contribuir para um bom desenvolvimento biopsicossocial da criança. Bowlby (2002) defende que as crianças necessitam de um ambiente de afeto que lhes favoreça segurança para viabilizar e garantir um desenvolvimento saudável.

Considerando-se os aspectos acima mencionados a respeito da importância da família para o desenvolvimento da criança, bem como a questão do ciclo de vida familiar, pode-se dizer que as experiências vivenciadas pela criança, tanto no contexto familiar quanto em outros ambientes nos quais ela está inserida, contribuem diretamente para a sua formação possibilitando um aprendizado essencial para a sua atuação futura.

Por essas razões, torna-se necessário o investimento em programas de orientação para estes pais e/ou responsáveis com a finalidade de instrumentalizá-los para poderem lidar de forma mais adequada com seus filhos, auxiliando-os a fornecer orientações mais precisas que sirvam de referência para as crianças. Assim, estes, por sua vez, podem ver os pais como modelos positivos ao qual podem recorrer diante das dificuldades de ajustamento que enfrentam.

Embora os resultados apontem para uma correlação entre o comportamento anti-social da criança e o modelo familiar ao qual ela faz parte, vale ressaltar que esse fator não pode ser considerado isolado, uma vez que outras fontes geradoras de violência podem influenciar diretamente na má conduta destas crianças. A precária condição sócio-econômica, o contexto escolar onde muitas vezes o aluno pode usar a agressão como um recurso contra o autoritarismo do professor, o meio social e cultural e o preconceito recebido por elas, são fatores causadores potenciais das agressões em suas vidas, onde a desigualdade social, por si só, já é agressiva, e não oferece oportunidades a estas crianças.

Nesse sentido torna-se importante trazer para discussão e comparação dados de pesquisa com crianças de diferentes classes sociais sobre comportamento agressivo e violência familiar, já que os sujeitos participantes deste estudo fazem parte de uma população imersa em uma série de fatores que colaboram para a ocorrência de violência em maior escala.

FONTE: http://artigos.psicologado.com/psicologia-geral/desenvolvimento-humano/a-influencia-da-familia-na-aquisicao-de-modelos-agressivos-pelas-criancas

segunda-feira, 30 de maio de 2011

continuação....

SEXUALIDADE E IMAGEM CORPORAL...


Uma vez doente, o paciente passa a se deparar com sentimentos de impotência e dependência, além das alterações em sua imagem corporal decorrentes do tratamento. Em geral, as condutas terapêuticas são tomadas por outro que não o paciente. As limitações físicas acarretam a necessidade de ajuda quase constante de familiares e amigos.
A aceitação da doença e a troca de informação dentro de sua família pode convir uma diminuição de estresse, possibilitando a expressão de emoções e sentimentos comuns, onde a família surge como um espaço de proteção tanto físico quanto emocional. A mutilação sem dúvida acarreta distúrbios de imagem corporal, e além de afetar a paciente traz implicações ao seu cônjuge, onde a imagem corporal é a figuração do nosso corpo, formada em nossa mente.
Freud (1997, p.112) refere que:
O sofrimento ameaça o homem a partir de três direções: do próprio corpo, condenado à decadência e à dissolução; do mundo externo que pode voltar-se contra o indivíduo com forças esmagadoras e impiedosas de destruição e aquele que talvez seja o mais penoso de todos, que é o relacionamento com os outros homens.
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As mulheres acometidas por esta neoplasia geralmente encontram-se num estágio emocional frágil, não tendo consciência de conflitos psíquicos, possuindo fantasias de sentimentos de culpa, medo, acompanhado de dor e sofrimento pela retirada do tumor na mastectomia, perda do parceiro, comprometimento da sexualidade, no qual todos esses aspectos venham a indicar a necessidade de apoio e acolhimento para que a mulher possa lidar com as modificações em seu corpo que reflete em muitos aspectos em sua vida. (PEÇANHA, 2008).
Frente à ameaça e sofrimento, é natural do ser humano a utilização de mecanismos de defesa para proteger-se possuindo relação direta com o histórico pessoal, valores e crenças no que é necessário para manter sua integridade psíquica.
A imagem corporal pode ser compreendida como a representação mental que a pessoa tem do próprio corpo, estando diretamente vinculada à percepção, compondo-se de aspectos fisiológicos, psico-afetivos, sócio-culturais, cognitivos e relacionais. Esse imagem é construída ao longo de toda vivência, a partir de experiências com o mundo exterior. (Duarte & Andrade, 2002; Huguet, 2005). Segundo Messa (s.d.) a imagem corporal é um processo peculiar de cada ser humano e aponta a relação do indivíduo com o mundo, através de como o corpo é sentido e percebido. Trata-se de um processo de constante dinamismo e mutação, e influencia as relações da pessoa consigo própria, com o ambiente e seus semelhantes.

Schilder (citado por Prado, 2002) afirma que a imagem corporal não existe isoladamente e que está diretamente relacionada à visão da sociedade em que a pessoa está inserida. A constituição da imagem do corpo, segundo a autora, é realizada através da incorporação da parte do corpo de outras pessoas e, desta forma, ao longo da vida a pessoa cria, destrói e reorganiza a sua imagem corporal a partir da imitação e observação de outras pessoas.

A perda da mama, parte do corpo fundamental para a identidade feminina, resulta na alteração negativa da imagem corporal. A retirada desse órgão representa uma limitação estética e funcional, que provoca uma imediata repercussão física e psíquica, constituindo um evento traumático para a maioria das mulheres, trazendo prejuízo em sua qualidade de vida, na satisfação sexual e recreativa. Além da cirurgia, o tratamento quimioterápico produz efeitos colaterais que são indicadores visíveis da doença, como alopécia ou perda do cabelo e ganho de peso. A mulher pode, então, se sentir estranha, manifestar sentimentos de vergonha, embaraço, ter dificuldade de se relacionar com o marido, se sentindo sexualmente repulsiva, passando a evitar contatos sexuais. Um medo muito freqüente entre as mulheres mastectomizadas é o de não ser mais atraente sexualmente. Esses conflitos são resolvidos quando a mulher é capaz de reconhecer-se e aceitar-se em sua nova imagem. Para isso, é fundamental viver um processo de luto para elaborar essa perda. (Arán et al., 1996; Huguet, 2005).

Lim (citado por Duarte & Andrade, 2002) observou em um estudo realizado em Cingapura com 20 mulheres mastectomizadas que, dentre a totalidade das participantes, 9 apresentaram problemas no relacionamento conjugal, como a diminuição na freqüência de relações sexuais. Houve também mudanças no comportamento sexual, em que as mulheres evitavam se despir diante dos parceiros e serem tocadas pelos mesmos. A utilização de camisas durante as relações sexuais também foram relatadas pelas pacientes. Algumas mulheres relataram ainda, que ao retomar a sua vida sexual, sentiram muita diferença e tinham medo do marido não aceitá-las mais.

Contudo o autor afirma que a mastectomia não é a única causa dessa sensação de desconforto relatada pelas pacientes. Segundo Lim há outros fatores, antecedentes ao diagnóstico, que podem influenciar e intensificar o quadro de desconforto para a mulher acometida, como problemas financeiros, sociais, conjugais, idade da paciente, sua forma de lidar com situações adversas e também a falta de informação sobre a doença e suas conseqüências. (op cit.).

Dentre as causas físicas associadas à evitação do intercurso sexual encontram-se a secura e atrofia vaiginais, fogachos e declínio da libido, que podem estar associados ao tratamento antiestrogênico. Porém, o tratamento desses sintomas melhora o desempenho sexual. (op cit.).

Duarte e Andrade (2002) verificaram que a reciprocidade da relação sexual depende da mulher, ou seja, se ela torna-se mais receptiva, o companheiro tende a aproximar-se mais dela e o relacionamento torna-se melhor. Segundo Rossi e Santos (citados por Sampaio, 2006) o relacionamento sexual depende muito de como era antes da doença. Aquelas mulheres com bom relacionamento com o parceiro tendem a continuar da mesma forma, mas aquelas que o relacionamento não era bom, relatam piora.

Huguet (2005) confirma esse raciocínio. Segundo a autora, mulheres com melhores relacionamentos reportam nos estudos menor índice de disfunção sexual e maior satisfação após o tratamento, quando comparadas àquelas que têm relacionamentos insatisfatórios. Dessa forma, a qualidade dos relacionamentos afetivos das mulheres com seus parceiros, antes do diagnóstico da doença, parece ser um fator de forte influência na qualidade de vida após o diagnóstico e mutilação. Segundo Padua (2006), muitos relacionamentos conjugais se desfazem em conseqüência da doença, pela falta de um diálogo aberto e satisfatório entre o casal. Assim, relacionamentos considerados frágeis antes da doença dificilmente sobrevivem após um evento traumático.

A qualidade do relacionamento existente entre o casal será responsável não só pelo alcance e a manutenção da estabilidade emocional da mulher, mas também pelo retorno do interesse sexual numa fase mais tranqüila da doença. Assim, após a cirurgia e com a estabilidade da doença, o casal volta a interessar-se pela vida sexual e começa a se preocupar com o relacionamento sexual de ambos. Buscam maior intimidade, trocas de carícias, prazer e novas formas de adaptação às condições atuais da mulher a fim de tornar o relacionamento sexual mais agradável, confortável e prazeroso. (Padua, 2006).

Um estudo realizado na Escola de Enfermagem da USP de Ribeirão Preto destaca que os casais retornam à atividade sexual em menos de um ano e que o homem além de revelar-se participativo, não tem alteração quanto ao seu desejo sexual, mesmo após a retirada da mama de sua parceira. No momento de intimidade fazem sexo praticando nudez e costumam tocar a mama operada. O resultado desta pesquisa concluiu que o câncer por si só não altera a sexualidade do casal. Tudo depende do relacionamento pré-existente entre ambos. (op cit.).

A reconstrução da mama



Reconstruir a mama pode representar a preservação da auto-imagem da mulher, melhor qualidade de vida, e portanto, um processo de reabilitação menos traumático. Inúmeros recursos de cirurgia plástica estão à disposição para amenizar os sentimentos pela alteração física provocada pela mastectomia. (Messa, s.d.; Prado, 2002).

A reconstrução pode ser realizada logo após a cirurgia ou em outro momento, de acordo com a indicação médica. Há várias técnicas que podem ser empregadas, sendo necessário uma escolha apropriada dependendo de cada caso. Pode ser um implante artificial de silicone, solução salina ou reconstituição com retalhos dos músculos abdominal ou grande dorsal. A reabilitação tem como principal objetivo a melhoria da qualidade de vida da paciente, atendendo às suas necessidades específicas, com medidas que visem a restauração anatômica e funcional, além do suporte físico e emocional. (Prado, 2002).

Para tal, a paciente deve estar informada sobre os riscos e benefícios obtidos, além de opinar e participar do processo de decisão. A cirurgia de reconstrução deve ser buscado por motivação pessoal, ou seja, para sua satisfação própria, e não para agradar ou satisfazer os outros. (Messa, s.d.). Segundo Melo (2002) é incerta a porcentagem de mulheres mastectomizadas que têm a intenção de procurar a reconstrução, mas este método na pós-mastectomia continua a ser uma importante opção estética e de reabilitação. A maioria das mulheres que procuraram a reconstrução sentiram-se felizes com os resultados estéticos, superando suas expectativas. (op cit.).

Já pesquisas com mulheres submetidas à reconstrução imediata têm demonstrado que além da satisfação estética devido aos resultados cirúrgicos, o índice de morbidade psicológica é significativamente inferior em relação à mastectomia somente. As pacientes então submetidas à reconstrução imediata demonstraram-se menos deprimidas e sofreram menor impacto quanto a sua feminilidade, auto-estima e atratividade sexual, em relação as outras não submetidas a reconstrução e as que optaram por reconstrução tardia. (Rowland & Massie, citados por Melo, 2002).

Um estudo realizado por Al-Ghazal et al. (citado por Maluf et al., 2005) constatou que 68% das pacientes submetidas à reconstrução imediata disseram-se muito satisfeitas com o resultado estético da cirurgia, e quando comparadas com grupo de reconstrução tardia, notou-se no segundo grupo, um grande nível de sofrimento psíquico e rebaixamento das funções psíquicas aliados a uma baixa auto-imagem. Os estudos mostram que a intervenção imediata possui vantagens relacionadas a um melhor resultado estético e custo benefício para as mulheres que a realizaram imediatamente após a cirurgia.

Dessa forma, parece que a reconstrução mamária melhora a auto-imagem, o senso de feminilidade e o relacionamento sexual. As mulheres que passaram pela cirurgia reparadora tendem a expressar atitudes positivas e satisfação com a aparência, além de menor temor da recidiva com a remoção da cicatriz. (Vianna, 2004).

Assim, atualmente, a reconstrução mamária é um recurso indispensável na reabilitação de pacientes que necessitam realizar a mastectomia, uma vez que auxilia quanto aos aspectos aqui relacionados.



REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS



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